Indigente - João Pestana, Lawless

Um dia acordei e vendi o cordão na praça

Ouro refinado das minas da desgraça, suado

Com poeira e fumaça, mas mais pesado

Pelo valor associado, meio desvalorizado

Por um punhado de moedas, dei o fruto de pedras

Raízes negras, velhas artérias

Adormecido fermentar de tantas eras

Sustentar de Roma e Tebas, das crias cegas

E de quem tudo vê

Leva o que cintila e arreda pé

O que brilha é pouso da fé, da ganância e santa sé

Massa reza, preza Santos patrões, haja virgens, padres indulgências, doações

Mais abundância nestes verões

Queremos ouvir o tilintar das carteiras

Polvo estica o sei tentáculo, ventosa, é incubadora de barreiras

Mesmo que não queiras, nasces controlado num estado vergado ao convênio sagrado

Hipocrisia corrupção e todos bem bem montados

Num Mercedes agarrado a qualquer mano que se tem safado

Ou nas costas do proletariado

Dinheiro, espatifa tudo

Não há roxo nem laranja que corrompa o teu futuro

Há quem use o metal circular para controlar a casta

Boa sorte comigo chapa ganha chapa gasta

É quem não diz basta, que se deixa levar pela cobra nefasta

Que a vaidade arrasta, se a vida e madrasta

Todo o santo reza pela pasta, enquanto o salmo afasta

Liturgia, quem diria, aquele que a pregava

Nunca foi quem a seguia

E assim cais do fundo para o poço, capital come te o almoço controla moço,

sentes o carpintar dos bichos

És lavado em caprichos, até esquecer que existes

Alguém quis mostrar mas tu não viste

Para suprimir os medos

Foram me dados brinquedos

Para me ligar a este poço de segredos

Boa sugestão Alfredo

Não sabias que eu brincava até descobrir o segredo

Para abusar sem medo

Deus não existe e a resposta está na bola

As vossas ganzas não me fumam e a garrafa não controla

A seringa não penetra a minha pele de estarola

As vossas putas não me apelam solo saio dou à sola

Para quem se consola com isso

Nunca serei submisso ao capricho

Uso o mecanismo para andar sem roda no piso

Mas raro deslizo, vejo a luz e persisto